Sou mulher e escrevo #1 — Thaciana Rodrigues

Eu, antropofágica, autossuficiente e egoísta, me alimentava de – e me sustentava em – meu próprio caos quando te conheci. Me encontrava presa ao desespero de quem já muito andou por terra e quando meus olhos encontraram os teus, deu-se o grito: mar à vista! Que medo que deu, eu, protegida de concreto, lidar com o fluído, o fluxo abstrato de tudo aquilo que somos. Há tanto medo nas frestas dos poros, nas esquinas do corpo, nas entranhas do ser. Mas tudo que temo, transpassa uma esperança cega no potencial do amor. Através da semiótica dos que colocam no que vêem o que viveram, não conseguia alcançar a liberdade de poder me ser e te amar. Mas teu amor vem amaciando minhas durezas e soprando minhas asas nesse ser-tão sem vento. Me ensinando a ser-tudo que tenho capacidade de ser. Até mesmo as coisas ruins. Porque é sabendo que posso sê-las que as encaro e digo não. Dizer não requer coragem. Tu me ensinaste a ser menos covarde, a esbravejar por mim, a canalizar minha raiva do mundo. O afeto funde-nos no imenso e a vida escorre em nós, banhando-nos de tudo o que não é raso. E eu choro e te vejo borrada e penso que me vês com nitidez, ainda que sem os óculos, ainda que teus olhos estejam fechados e teu nariz colado no meu. Deitas na depressão do meu peito e tenho medo que caias em meus abismos. Às vezes parece que tenho medo por ti e por mim, então tu me contas sobre alguma coisa doida que sentiste e que eu já senti igual. Tuas palavras parecem carregar o peso de minha leveza insustentável. Me ensinaste também a existir sem culpa e a perdoar meus crimes. Pessoas como nós se debatem nas próprias cavidades soltas, gritam no oco do peito e desacreditam de seu próprio eco. Pessoas como nós têm os corpos tortos de tanto se deitarem em posição fetal e morrer tantas vezes com a rispidez do mundo. Nossos corpos, imersos nas próprias melancolias se afogam entre si, no encontro de dois oceanos que se fundem e se confundem. Pessoas como nós, quando encontram-se, colidem como a explosão de bilhões de elementos universais que podem virar poeira ou um planeta. Teu amor cósmico explode estrelas em mim. Tua existência estará sempre intrinsecamente ligada à minha. Nossos tijolos permanecerão, ainda que mudem-se as tintas.

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